Brasileira que fez retorno voluntário do Reino Unido ganhou R$ 22 mil do governo britânico e não pode retornar por 5 anos
Ana Claudia Morais contou ao g1 que retornou ao Brasil em voo comercial em setembro. Reportagem do jornal 'The Guardian' afirma que mais de 600 brasileiros fora...
Ana Claudia Morais contou ao g1 que retornou ao Brasil em voo comercial em setembro. Reportagem do jornal 'The Guardian' afirma que mais de 600 brasileiros foram deportados entre agosto e setembro deste ano. Itamaraty afirma que não se trata de deportação e, sim, de retorno voluntário. Brasileira faz retorno voluntário do Reino Unido e recebe R$ 22 mil do governo do país Uma brasileira que aceitou fazer o retorno voluntário de imigrantes ilegais do Reino Unido contou que, ao fechar o acordo, recebeu 3 mil libras (cerca de R$ 22 mil) do governo britânico, retornou ao Brasil em voo comercial, e que não pode retornar ao país por cinco anos. Uma reportagem do jornal britânico "The Guardian" afirmou que mais de 600 brasileiros -- incluindo 109 crianças -- foram deportados do Reino Unido em três voos secretos do governo, entre agosto e setembro deste ano. A maioria retornou por meio do Programa de Retorno Voluntário (VRS, em sua sigla em inglês), segundo o Ministério do Interior britânico. Ao g1, Ana Claudia Morais, de São Simão (GO) conta que foi para Londres em abril de 2021 para trabalhar e conseguir dinheiro para construir uma casa no Brasil. Por lá, ficou três anos trabalhando com faxinas, até que soube que estava grávida e decidiu voltar. Segundo ela, soube por um centro de assistência à brasileiros em Londres que havia a opção de retorno voluntário, em que receberia passagem e uma assistência para voltar. "Eu entrei em contato com a embaixada britânica, pedia a ajuda e eles me responderam com a passagem de volta e o suporte financeiro", conta. Segundo ela, o pedido foi feito em 30 de julho e a passagem foi dada para 11 de setembro. "Eu decidi fazer isso porque eu tinha ido ganhar um dinheiro para construir a minha casa que eu não tinha condições aqui no Brasil. Foram três anos mandando o dinheiro para a obra e eu tinha como meta que, assim que acabasse, eu voltaria. Eu tenho dois filhos que ficaram no Brasil. (...). Eles ainda ofereceram 3 mil libras que estavam em um cartão e que daria direito ao saque no Brasil." Ana Claudia Morais retornou ao Brasil por meio de programa de retorno voluntário do governo britânico Arquivo Pessoal Ao aceitar o retorno voluntário, Ana Claudia foi informada que receberia o dinheiro e que seu nome entraria no sistema de imigração do Reino Unido, impedido que ela retornasse ao país em um período mínimo de cinco anos. "Eles não falaram que isso era uma deportação, até porque tinha até um 'prêmio', mas também não nos disseram qual seria a diferença entre quem aceitou o retorno voluntário de quem era pego ilegal no país e, por isso, deportado." O Guardian revelou que a repatriação dos brasileiros foi feito em voos secretos. Ana explica que, assim como ela, conhece outras dezenas de pessoas que também pediram no mesmo período o retorno voluntário. No entanto, diferente do que pensou, não foram organizados voos com todos os brasileiros para o retorno, mas eles eram mandados em voos comerciais, nunca em grupos. No caso dela, voltou em voo comum e havia apenas um outro brasileiro que estava voltando pelo mesmo programa. "Eles separavam as pessoas, colocavam no máximo quatro pessoas por voo, em voos comerciais. Não eram voos fretados." Ana Claudia conta que ao chegar ao Brasil, eles também pediram que o dinheiro fosse sacado o mais rápido possível e foi o que ela fez. "Eles deram esse dinheiro como que para nos ajudar a nos reestabelecer no país de origem, mas reforçavam que era para tirar tudo no cartão que deram assim que chegasse ao Brasil", diz. Mais de 600 brasileiros deportados Mais de 600 brasileiros são deportados do Reino Unido em voos secretos do governo O governo britânico disse ao "The Guardian" que está intensificando as medidas contra a migração ilegal. Organizações que protegem os direitos de imigrantes latino-americanos no Reino Unido expressaram preocupação, especialmente com o alto número de crianças retiradas do país. Números de deportação publicados na quinta-feira (28) pelo Ministério do Interior britânico, órgão responsável pelas políticas de migração, mostram que 8.308 retornos forçados e voluntários foram feitos entre julho e setembro de 2024. A quantidade é 16% maior em relação ao mesmo período do ano passado. A maioria das viagens (6.247) foi voluntária, segundo o relatório. O governo oferece incentivos de até 3mil libras (cerca de R$ 22 mil) para pessoas que aceitam ser deportadas voluntariamente do Reino Unido. Apesar de ter divulgado os números, o Ministério do Interior escondeu que o destino dos voos com quantidade recorde de imigrantes era o Brasil. Os três voos relatados pelo "Guardian" aconteceram em um período de menos de dois meses -- a reportagem não cita para quais cidades brasileiras foram levados os imigrantes: Em 9 de agosto, 205 pessoas foram deportadas, entre elas 43 crianças; Em 23 de agosto, 206 foram deportadas, incluindo 30 crianças; Em 27 de setembro, foram 218 deportados, 36 deles crianças. O "The Guardian" menciona que todas as crianças retiradas do país faziam parte de unidades familiares. Muitas delas estavam matriculadas em escolas e passaram a maior parte -- ou toda a vida -- no Reino Unido. De acordo com a reportagem, as deportações de brasileiros foram classificadas pelo governo como voluntárias e incluíram pessoas que ultrapassaram o prazo de permanência de seus vistos. “Estamos preocupados com o aumento acentuado nos retornos voluntários de brasileiros no último ano", afirmou a organização Coalition of Latin Americans in the UK (Coalizão de Latino-Americanos no Reino Unido) em comunicado publicado pelo "Guardian". A entidade acrescentou: "Como a maior comunidade latino-americana no Reino Unido, os brasileiros enfrentam barreiras significativas para acessar informações de alta qualidade e aconselhamento jurídico credenciado, especialmente em seu próprio idioma." "Muitos chegaram por meio da migração de países da União Europeia. No entanto, as mudanças nas regras de imigração pós-Brexit deixaram centenas deles e seus familiares fora da UE, com risco de terem seus direitos negados devido à desinformação e aos rigorosos requisitos de elegibilidade.” Com a saída dos britânicos da União Europeia, aprovada em um plebiscito em 2016, pessoas que planejavam se mudar entre países do bloco e o Reino Unido passaram a não ter mais permissão automática para a nova residência. A regra passou a valer em 2021, quando entrou em vigor um acordo para definir os termos do Brexit. O que diz o governo britânico Ao "Guardian", um porta-voz do Ministério do Interior britânico disse que o governo está cumprindo um plano de aumentar a deportação de imigrantes ilegais. “Isso reduzirá nossa dependência de hotéis e custos de acomodação, economizando cerca de 4 bilhões de libras nos próximos dois anos." Em abril deste ano, o Parlamento do Reino Unido aprovou uma lei para permitir que o governo force imigrantes que chegaram de qualquer lugar do mundo e pediram asilo em solo britânico a entrar em um avião que os leve para Ruanda – mesmo que a pessoa nunca tenha pisado em Ruanda. A medida era uma das principais bandeiras do ex-primeiro-ministro, Rishi Sunak, que é filho de imigrantes indianos. Em junho, o primeiro voo para levar requerentes de asilo para Ruanda foi suspenso, depois que o tribunal europeu de direitos humanos emitiu liminares para impedir a deportação de imigrantes a bordo. O que diz o Itamaraty Em nota, o Itamaraty informou que o Reino Unido propôs organizar voos de retorno voluntário ao Brasil, por companhias aéreas comerciais, para brasileiros inscritos no Programa de Retorno Voluntário (VRS, em sua sigla em inglês), mantido pelo Ministério do Interior britânico. Além de auxílio financeiro, o VRS oferece passagens aéreas para os migrantes que desejam retornar aos seus países de origem. "O processo de retorno voluntário proposto pelo Reino Unido coaduna-se com os princípios da assistência consular brasileira que, em casos específicos, também financia a viagem de brasileiros em situações de desvalimento no exterior, além de contar com parceira de natureza semelhante com a Organização Internacional para Migrações (OIM)", diz o comunicado. "O consentimento brasileiro ao programa baseia-se no requisito de que a participação dos nacionais é voluntária e poderá ser revista, a qualquer tempo, caso esses termos sejam alterados."